Biblioteca - Local Público

Mesmo à beira da extinção humana, nossa história, nossas culturas e conhecimento não devem ser perdidos. E a biblioteca da LVHS é quem guarda todas essas informações. Livros um tanto empoeirados, organizados em ordem alfabética, estão dispostos nas estantes enormes. Há mesas e cadeiras entre estantes de livros, onde os sobreviventes podem apreciar uma boa leitura, buscando a fuga da realidade em que se encontram agora. Tentando escapar para o incrível mundo de fantasia que a literatura nos fornece. Há sempre um compulsivo leitor devorando as páginas de um livro qualquer nesse lugar.

Remembering

É estranho como, às vezes, somos obrigados a nos transformar naquilo que não queríamos ser. As pessoas e o mundo costumam fazer isso com os mais frágeis. Inclusive comigo. Sim, o sol mal surgira de trás dos enormes prédios de Las Vegas e as pessoas já voltavam a me tratar com um incapaz. Talvez eu seja mesmo um incapaz. Mas não há nada que eu odeie mais do que ser julgado por adultos. São tão cheios de si. Tão... Será que eles se esqueceram do que foram antes do pré-apocalipse? Porcos corruptos, larápios descarados, seres desumanos que encaravam o sofrimento e apenas viravam as costas.

A biblioteca estava vazia quando cheguei. Os livros, mesmo depois dos eventos apocalípticos, continuavam organizados em suas prateleiras. E eram eles que me faziam voltar aos tempos em que escolas eram realmente escolas, não abrigos para sobreviventes. Aproximei-me do enorme balcão de mogno mármore branco onde, provavelmente, ficava a bibliotecária. Adentrei o mesmo, procurando qualquer coisa que na qual eu pudesse desenhar por ali. Finalmente, encontrei algumas folhas e um lápis. Sentei-me ali mesmo, encostado na parede e escondido pelo enorme balcão. Aquele, talvez, fosse o único lugar onde uma criança poderia ficar sozinha, longe de olhares adultos.

- Há algum problema em tentar ser uma criança, mesmo que o mundo esteja acabando? Bom, eu acho que não. - Franzi o cenho, fitando um ponto qualquer à minha frente. Eu estava falando sozinho. E isso, mesmo para mim, era estranho.

Fechei meus olhos e inspirei o ar pesado. Apesar das criaturas nefastas lá fora, ali eu sentia-me protegido. O lápis tocou a folha de papel e as curvas começaram a surgir. Desenhos ainda amadores, mas que já refletiam as minhas emoções. Aos poucos as linhas iam tomando forma e o desenho ia surgindo. Os rabiscos iam tomando a forma de uma casa, uma criança assustada e um zumbi que rastejava em direção ao garoto assustado. Por que aquela cena voltara à minha mente? Será que ela voltou para relembrar-me o quão frágil eu sou? Talvez...

O cenário me fez lembrar meus parentes, desaparecidos após o início do apocalipse. No fundo, ainda desejava que eles estivessem a salvo, em algum lugar, mas compreendia que as chances eram remotas. Joguei o peso de meu corpo para o lado, caindo sobre o frio piso da biblioteca. Lancei o lápis contra o balcão e amassei a folha onde gravara um dos piores momentos de minha vida, fitando o teto do salão e desejando que tudo voltasse ao normal...

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